4 de novembro de 2007

Produtos orgânicos não são garantia de saúde para a pele

Alguns extratos 'naturais' podem causar reações adversas, afirmam especialistas. Dermatologistas aconselham a leitura de rótulos de produtos 'naturais' e 'orgânicos'.



Segundo representantes do governo norte-americano e da indústria cosmética, não há prova científica de que cosméticos orgânicos sejam mais seguros, saudáveis e eficientes
(Foto: Mutt Ink/The New York Times).


Para Flavia Kawaja, designer de interiores de Manhattan, uma visita ao departamento de produtos de beleza da Whole Foods Market, a megaloja norte-americana de alimentos e produtos naturais, é feita não com uma listinha de compras, mas com uma lista imaginária de quais ingredientes sintéticos devem ser evitados.

Kawaja, por cautela, não usa antiperspirante feito com derivados de alumínio, caso um dia se comprove a lenda urbana de que o produto causa doenças como Alzheimer. Ela também mantém distância de produtos de tratamento da pele que contêm parabenos, agentes comuns antibactericidas usados como conservantes em alguns cosméticos, remédios e alimentos.
Embora não haja exames clínicos rigorosos em grande escala que demonstrem que os parabenos nos cosméticos representam um risco aos consumidores de produtos de beleza, alguns estudos revelaram que a exposição aos parabenos pode provocar alterações reprodutivas em roedores de laboratório.

Optando por cosméticos comercializados como naturais ou orgânicos, Kawaja peca pelo excesso de precaução. Ainda assim, ela admite que não tem muita certeza se sua escolha cuidadosa de xampus e protetores solares naturais representa benefícios à saúde.
"Não parto do pressuposto de que orgânico automaticamente signifique bom para a saúde", disse ela. "Quero dizer que se você fritar uma batata orgânica, ela continuará sendo batata frita."

Rótulos
Os especialistas em produtos orgânicos há muito tempo adquiriram o hábito de ler os rótulos de alimentos para descartar aqueles cultivados com pesticidas ou que contêm colorantes, aromatizantes ou conservantes sintéticos. Agora, no encalço de recentes preocupações com a saúde diante de rações animais e cremes dentais contaminados, alguns especialistas em beleza estão procurando cosméticos sem componentes sintéticos, partindo da crença de que os produtos fabricados sem ingredientes industrializados, como os petroquímicos, são mais saudáveis.

Essa nova categoria de inspetores de rótulos está provocando um "boom" no mercado dos chamados produtos naturais e orgânicos de higiene pessoal. Os cosméticos naturais se vendem como fabricados com ingredientes vegetais e minerais e os produtos orgânicos se dizem fabricados com ingredientes agrícolas cultivados sem agrotóxicos.

No período de 12 meses findo em 9 de setembro, os norte-americanos gastaram US$ 150 milhões nas três principais marcas de produtos naturais de higiene pessoal voltadas para o mercado de massa, a Burt's Bees, a Jason Natural Cosmetics e a Tom's of Maine, indicando um aumento de US$ 51 milhões em relação ao ano anterior, segundo a Information Resources Inc., empresa de pesquisa de mercado.

Ao mesmo tempo, as vendas de produtos orgânicos de cuidado pessoal atingiram US$ 350 milhões no ano passado, um aumento de US$ 68 milhões em relação a 2005, de acordo com dados dos fabricantes compilados pela Organic Trade Association, grupo atuante no setor.
"Estamos presenciando uma conscientização maior de que aquilo que você aplica sobre o corpo é tão importante quanto aquilo que você coloca para dentro do corpo", declarou Jeremiah McElwee, coordenador sênior responsável pela área de tratamento pessoal da Whole Foods, departamento que registra o crescimento mais rápido da empresa. "O maior estímulo a comprar produtos de tratamento para o corpo naturais ou orgânicos é o notável benefício à saúde."

Natural e orgânico
Pareceria lógico supor que ingredientes comestíveis comuns como azeitona ou soja seriam naturalmente mais saudáveis para a pele e o corpo do que ingredientes cosméticos industrializados com infinitas sílabas impronunciáveis como o conservante metilcloroisotiazolinona. Contudo, representantes do governo e da indústria da beleza, além de alguns ambientalistas, reconhecem que não existe comprovação científica que suporte a idéia de que cosméticos à base de vegetais sejam mais seguros, saudáveis ou mais eficazes para as pessoas.

"Os consumidores não devem necessariamente supor que um ingrediente ou produto 'orgânico' ou 'natural' contém uma segurança inerente maior do que outra versão quimicamente idêntica do mesmo ingrediente", explicou por e-mail Linda M. Katz, diretora do Departamento de Cosméticos e Colorantes do Food and Drug Administration (FDA). "Na verdade, os ingredientes 'naturais' podem ser mais difíceis de preservar contra contaminação e reprodução microbial do que as matérias-primas sintéticas." A confusão em relação à "legitimidade" do mercado de produtos naturais de tratamento pessoal também se origina da ausência de padrões nacionais.

O FDA, órgão norte-americano que controla, entre outras coisas, os cosméticos, nunca estabeleceu definições padronizadas para termos usados no marketing, como natural e orgânico, aplicados a produtos de beleza, disse Katz. Sendo assim, os fabricantes estão livres para usar esses termos em tudo, desde xampu de base sintética com apenas um derivado vegetal, até pó facial sem ingredientes sintéticos formulados apenas com minerais.

O órgão exige que os fabricantes garantam que os cosméticos são seguros para os fins a que se destinam. No entanto, ele deixa a cargo dos fabricantes a decisão de quais testes de segurança e eficácia serão realizados em ingredientes e produtos finais. John Bailey, vice-presidente executivo de ciência da Associação de Cosméticos, Higiene Pessoal e Perfumaria, grupo comercial sediado em Washington, afirmou que os cosméticos são seguros, sejam os que possuem fórmulas sintéticas ou vegetais. "Basicamente eles são submetidos aos mesmos padrões legais e regulamentares", declarou Bailey, que possui doutorado em química.

No entanto, Jane Houlihan, vice-presidente de pesquisa do Environmental Working Group, grupo sem fins lucrativos de Washington, disse que a falta de padrões federais estabelecidos é responsável pela dúvida do consumidor sobre se os produtos naturais proporcionam vantagens tangíveis ou se são simplesmente um engodo para a turma ecologicamente correta.
"Mesmo se o produto de beleza alegar que é feito puramente de terra, é preciso ler o rótulo de ingredientes", disse Houlihan.

Ingredientes exóticos
Houlihan contou que o maior interesse dos consumidores pelos produtos naturais está fazendo com que alguns fabricantes incluam plantas exóticas nas fórmulas e esses ingredientes não possuem cadastro de referência no setor de beleza. Por exemplo, como ela conta, o grupo não encontrou dados de segurança publicados sobre ingredientes mais novos de cosméticos como o óleo da casca da árvore de pau-rosa, do oeste da Índia, e extrato da flor de peônia.
"O simples fato de um ingrediente ser obtido de uma planta não o torna necessariamente seguro para o uso em cosméticos", alertou Houlihan. "Tabaco, cicuta e poison ivy (espécie de erva venenosa) são exemplos de plantas que podem ser perigosas."

Na realidade, alguns dermatologistas dizem que até os ingredientes naturais que parecem benignos pode causar alergias na pele. Por exemplo, David A. Kiken, chefe da dermatologia da faculdade de medicina da Universidade da Califórnia, em San Diego, contou que teve irritações na pele provocadas por óleo de melaleuca, camomila e chá verde presente em cosméticos.

"Embora o termo 'extratos botânicos naturais' tenha uma conotação inerente de algo com propriedades benéficas, esses extratos podem causar reações adversas nas pessoas", escreveu Kiken em um artigo publicado no periódico American Journal of Contact Dermatitis.

Na falta de padrões do FDA, dezenas de empresas e lojas de produtos de beleza estão usando palavras como botânico, herbal, natural, puro e orgânico para vender suas marcas, porém cada uma adota seu próprio critério e definição.




Por: Natasha Singer

Origem: The New York Times

Fonte: http://g1.globo.com

Nenhum comentário:

 
BlogBlogs.Com.Br
Google